terça-feira, 13 de maio de 2008

Matéria sobre gatos abandonados - O secreto abandono de uma espécie

O secreto abandono de uma espécie
Largados em qualquer local da cidade e sofrendo com os maus-tratos, os gatos de rua parecem invisíveis a muitos.

Por Renata Coré e
Luiz Renato D. Coutinho

Quem, da calçada, vislumbra a fachada, guarda a impressão de se tratar de apenas mais uma casa na zona Norte do Rio de Janeiro. Logo que se chega ao interior, no entanto, percebem-se os sinais de que aquela não é uma residência comum. Em uma das ruas da Tijuca, Andréa Lambert compartilha o endereço com cerca de 60 gatos de variadas idades, cores e particularidades. O que todos têm em comum é que, antes de seus caminhos se cruzarem com o da médica veterinária, eram moradores do Campo de Santana. Também conhecido como Praça da República, o parque no Centro da cidade, onde dom João VI e dom Pedro I foram aclamados imperadores do Brasil, hoje é cenário de uma história nem um pouco nobre. Lá, inúmeros felinos sobrevivem em estado de abandono.
Há dez anos, Andréa se dedica a cuidar dos gatos do Campo de Santana. O trabalho voluntário desenvolvido pela médica veterinária, no parque e também no Hospital Municipal Souza Aguiar, consiste em castrar e posteriormente devolver animais que não possuam perfil favorável para adoção, tratar aqueles que estejam doentes e recolher os frágeis filhotes.
— Há gatos abandonados em praticamente todos os hospitais, em estacionamentos, em qualquer ruazinha do Centro, na Quinta da Boa Vista – enumera a veterinária, consciente de que sua iniciativa funciona como um paliativo, mas está longe de solucionar a questão dos felinos sem donos.
Além do Campo de Santana e da Quinta, existem outros endereços mais conhecidos como depósitos de gatos rejeitados. O Jockey Club da Gávea, o Parque Lage, situado no bairro do Jardim Botânico, e o Mirante do Pasmado são exemplos.
— Enquanto o poder público não fizer uma ação efetiva de castração, coibir o abandono, a situação não vai melhorar – afirma a veterinária.

População ignorada
Não há números oficiais ou extra-oficiais relativos à população de gatos de rua vivendo na cidade. De acordo com a Secretaria Especial de Promoção e Defesa dos Animais (SEPDA) da prefeitura, a alta rotatividade impossibilita esse tipo de contagem, mas sabe-se que o número é bastante alto. Ainda segundo a secretaria, nos períodos que antecedem feriados e férias as ocorrências de abandono aumentam muito.
A única estimativa que se tem é a do número total de gatos no Brasil. Os fabricantes de ração falam em 13 milhões de gatos.
– No entanto, sabemos que esse número é bem maior, considerando aqueles que sobrevivem de outros alimentos. Quanto aos abandonados, é impossível precisar, já que esses animais formam colônias praticamente invisíveis aos olhos humanos – explica o ambientalista e presidente da Arca Brasil, Marco Ciampi. A ONG realiza campanhas permanentes pela posse responsável e desenvolve um programa de controle de natalidade de cães e gatos. No seu site ficamos sabendo que no Brasil há um cachorro para cada sete humanos e 10% deste total é de animais abandonados (não há estimativa para felinos).
Um abrigo pede socorro
A principal causa de abandono é a gestação indesejada. Isso é o que informa a assessoria da SEPDA, acrescentando que, em 2007, foram realizadas mais de 10 mil esterilizações gratuitas por meio do Programa Bicho Rio e centenas de animais domésticos ganharam novos lares em função das Campanhas Educativas de Adoção de Animais. Apesar disso, o fato é que sobra trabalho – e muito – para os voluntários preocupados com o bem-estar dos gatos ou de outros animais abandonados.
É o caso do Abrigo da Mariazinha, onde vivem cerca de 200 gatos e 300 cães. O sítio, localizado em Santa Cruz, na zona Oeste da cidade, é mantido pela advogada aposentada Maria do Socorro Barbosa e Silva. Com necessidades urgentes de obras de infra-estrutura, ração, medicamentos em geral e até potes para comida e água, o abrigo foi forçado a suspender a adoção de animais, já que a meta é oferecê-los somente quando castrados e com as vacinas em dia.
Na esperança de melhorar a situação, Maria e os quatro voluntários do sítio têm planos de começar uma associação, para facilitar a obtenção de apoio junto a empresas e, com isso, conseguir atender as necessidades dos gatos e cães moradores do abrigo. Depois que todos os animais estiverem devidamente castrados e vacinados, a intenção é criar um site com informações sobre os bichanos disponíveis para adoção, segundo Adriana Rodrigues, voluntária do abrigo desde dezembro.
Ajuda e adoção
Além de estar expostos a possíveis crueldades, gatos abandonados podem ser reservatórios de zoonoses – como raiva, sarna, micoses e verminoses, entre outras doenças. Por isso, ao recolher um animal da rua, é importante observar seu estado e notar se ele possui feridas ou alguma doença de pele. Antes de levar o animal para casa, é recomendável que seja examinado por um veterinário.
Segundo Andréa, gatos vivem bem mesmo em apartamentos e não exigem do dono cuidados complexos:
— É importante levá-los ao veterinário ao menos uma vez por ano, manter a água limpa, observar as fezes e a urina e oferecer ração de boa qualidade – ensina.
Os interessados em adotar um gatinho podem recorrer ao site mantido pela veterinária <>

antana.kit.net > (onde também é possível adquirir camisetas e dar apoio aos bichanos) ou recorrer às Campanhas Educativas de Adoção de Animais, realizadas quinzenalmente pela SEPDA, em diferentes pontos da cidade.
Há outras maneiras de auxiliar animais abandonados, além da adoção. Quem quiser tomar partido sem levar um gatinho para casa, tem a possibilidade de doar ração, medicamento ou procurar uma maneira que considere a mais adequada para ajudar os abrigos e voluntários que socorrem animais (veja boxe com os endereços).
Enquanto isso, a médica continua sua batalha de amparo aos bichanos. Há mais de cinco anos, ela ia uma vez por semana ao Jockey Club da Gávea. Sua missão era esterilizar os gatos de rua, os gatos dos empregados, e os que viviam nas cocheiras (é costume colocá-los junto às moradias dos cavalos para proteger estes dos ratos). Agora, ela pretende retomar o trabalho no Jockey.
Nunca é demais explicar que o gato é, sim, um ótimo amigo do homem. Além disso, a espécie, caçadora nata, presta um grande serviço à humanidade, livrando-a de inúmeras doenças transmitidas por insetos e roedores. Então, pensando em adotar?

Matéria impresa
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