sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Pingüins-de-magalhães iniciam jornada de volta ao lar

Os pingüins-de-magalhães que invadiram as praias do litoral da Bahia durante o inverno começaram a fazer o caminho de volta à Patagônia na madrugada desta sexta-feira, 3.
Sob os cuidados de oito tripulantes e 12 ambientalistas, os 399 ilustres passageiros embarcaram a bordo de um turbo-hélice Hercules C-130 da Força Aérea Brasileira (FAB) que decolou da Base Aérea de Salvador à 1h30 e tinha previsão de chegada no aeroporto de Pelotas-RS às 6h45.

Logo após o desembarque, estava programado o transporte das aves de caminhão por mais 60km até a sede do Centro de Recuperação de Animais Marinhos (Cram), onde descansarão o restante do dia. No sábado, Dia Mundial dos Animais, as aves serão soltas na Praia do Cassino, de onde se espera que reencontrem o caminho de volta ao lar pela corrente das Malvinas.

O restante da viagem terá de ser feita com as próprias asas - que no caso particular dos pingüins não servem para voar e funcionam como barbatanas. Todos os viajantes receberam nas patas anilhas Centro de Conservação de Aves Silvestres (Cemave) para futuro monitoramento.

"É a maior operação de translocação de animais de que se tem notícia no Brasil", diz o coordenador do Instituto de Mamíferos Aquáticos (IMA), Luciano Reis. Uma operação que mobilizou mais de mais de 50 pessoas, entre militares da base Aérea de Salvador e do 1º Grupo de Transporte de Tropa da Base Aérea dos Afonsos-RJ, de onde veio a aeronave da FAB, além de funcionários da Petrobras, que providenciou o transporte terrestre, do Ibama, do IMA e da ONG Ifaw (Fundo Internacional para Proteção dos Animais em seu Habitat).

O vôo atrasou exatas 41 horas e 30 minutos. Era para ter deixado a base aérea de Salvador às 8h de quarta-feira, 1º de outubro, mas um problema no trem-de-pouso da aeronave provocou sucessivos adiamentos na viagem. Um atraso providencial, pois acabou permitindo a inclusão de 69 aves que não poderiam viajar porque não tinham passado no teste de impermeabilidade da plumagem, cuja finalidade é avaliar a capacidade que as aves têm de se protegerem da hipotermia.

O contingente de pingüins que embarcou nesta sexta-feira não representa um quarto dos 1.650 animais resgatados apenas na Bahia. Desse contingente, 90 aves sem condição de viajar continuarão em tratamento na sede do IMA, em Salvador. Doentes, fracas e feridas, a maioria delas está condenada a passar o resto da existência em cativeiro. Tiveram mais sorte que as 309 que morreram na sede do IMA e as 852 que não resistiram à viagem de mais de 3 mil quilômetros empreendida desde os litorais da Argentina, Chile e Ilhas Malvinas e já foram encontradas mortas.

Êxodo
Os pingüins começaram a chegar em julho ao litoral brasileiro. A presença destes animais durante o inverno nas praias do Sul, Sudeste e até do Nordeste não é inédita, mas a quantidade registrada neste ano foi atípica. Nunca haviam sido resgatados mais do que 10 pingüins por ano em todo o Estado da Bahia.

Os registros também foram elevados nos Estados de São Paulo, por volta de 600, e Rio de Janeiro, em torno de 300.

A tese mais provável para justificar a invasão dos pingüins é a mudança da temperatura das águas provocada pelo fenômeno climático La Niña, que teria confundido os pingüins no período em que eles normalmente migram para o Norte em busca dos cardumes de anchovas, seu alimento preferido.

"A maioria das aves encontradas são jovens, com idade entre três meses e um ano e meio, quando ainda não há o compromisso de voltar para procriar", observou a ambientalista Valéria Ruoppulo, da Ifaw. Entre os mais de 1.600 pingüins encontrados na Bahia, apenas quatro eram adultos.

Todos os pingüins chegaram desidratados, desnutridos e com hiportemia, o que obrigou IMA e Ibama a fazerem repetidos apelos aos banhistas que os encontrassem nas praias para não colocá-los em caixas refrigerados na tentativa de socorrê-los, como prega o senso comum.

Despreparados para o crescente número de aves que diariamente eram encaminhadas à sede do instituto, no Parque de Pituaçu, os profissionais do IMA, uma ONG que não é especializada em aves, e sim em mamíferos aquáticos, como lontras e lobos marinhos, enfrentaram todo o tipo de escassez: de medicamentos, de alimentos, de pessoal e até de espaço para abrigar tantos visitantes inesperados.

O IMA contou com o apoio do Ibama, das secretarias estaduais da Saúde e do Meio Ambiente, do Zoológico de Salvador, da Marinha, do programa Bahia Pesca e de cidadãos comuns, que doaram tempo ou dinheiro para a entidade, que mesmo assim gastou cerca de R$ 120 mil a mais com os pingüins.

Mesmo diante da situação caótica, houve quem tentasse tirar vantagem. O IMA recebeu uma denúncia por telefone que um banhista queria vender um animal recém-capturado na praia por R$ 500. O caso virou motivo de piada. Afinal, quem pagaria para levar para casa um animal que, debilitado poderia transmitir doenças desconhecidas ao homem, e saudável consome dois quilos de peixe por dia?
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2008/10/03/ult5772u946.jhtm

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