A veterinária Cristiane Astrini, de 34 anos, conheceu a gata Corujinha há cinco anos, quando ela foi levada para o seu consultório para sacrifício. A gata vivia na rua e perdeu o movimento das patas traseiras depois de cair de uma árvore. Como era conhecida no bairro, algumas pessoas ainda bancaram um tratamento para ela recuperar os movimentos, mas não teve jeito. Como ela andava se arrastando na rua, os vizinhos decidiram entregar ela à veterinária para sacrifício.
“Eu fiquei com dó e resolvi tentar cuidar dela. Tratei com homeopatia e contei com a ajuda de uma amiga que é acupunturista”, conta Cristiane. Corujinha recuperou apenas a sensibilidade das patas direitas, mas garantiu o direito de continuar vivendo.
“Como ela tem incontinência urinária, precisa usar fralda todos os dias”, conta a veterinária, que, diariamente, faz massagem na região da bexiga da gata para estimular o xixi. “Mas ela se vira muito bem. Até entra em briga com os outros gatos e escala as gaiolas. Ela apronta mesmo”, relata a dona.
Mas corujinha não é a única “portadora de necessidades especiais” de que Cristiane toma conta. A outra vira-lata Dolly é surda e foi resgatada da rua quando ignorava as buzinas dos carros. “Meu cunhado resgatou ela, mas ninguém sabia que a gata era surda”. A vida fez com que Dolly fosse parar no escritório do sogro de Cristiane, mas o regulamento do condomínio não permitia animais.
“Descobriram que ela morava lá porque ela miava muito alto, justamente porque ela é surda”, conta. Dolly, então, foi doada para uma amiga da família, que tinha outros cinco gatos. A nova dona morreu e Dolly ficou órfã com os irmãos. “Meu sogro resgatou os gatos e levou para o consultório. Quatro eram saudáveis, e eu consegui novos donos logo. Ficaram Dolly e outra gata que era velha, preta, desdentada e gorda. Essa ninguém ia querer adotar mesmo, e eu levei para a minha casa”.
Depois de passar por tantos donos, Dolly conseguiu um lar definitivo, por mais que ele seja uma clínica veterinária. “Achei que não era justo mandar ela para outra família”, diz Cristiane, que cuidará de Dolly e de Corujinha “até elas morrerem de velhice”.
“Acho que as pessoas têm medo de enfrentar a situação, pensam nos gastos e que vão ter que ficar presas em casa”, observa. “As pessoas são mais dispostas a encarar a situação [cuidar de um bicho com limitações] quando ela acontece com um animal que já faz parte da família”, completa.
Quem adota um animal deficiente diz que o mascote é "igual a qualquer outro".
Dona diz que não adianta ficar com pena, é preciso dar chance ao bicho.
Quando o operador de telemarketing Kleber Alves, de 26 anos, levou a vira-lata Charlote para casa, há sete meses, achava que a nova mascote da família iria dar muito mais trabalho que um bicho de estimação comum, porque a cachorra não tem a pata esquerda da frente.O jovem nunca tinha cuidado de um animal de estimação com limitações, mas percebeu que a ausência da pata não fez de Charlote um animal apático. “Ela é fujona e adora correr atrás da molecada do prédio. Às vezes, ela tropeça, principalmente quando está correndo e vai parar. Acho que é porque não tem muito apoio”, conta Alves, fazendo questão de mostrar que a mascote contrariou suas expectativas e se mostrou um animal “normal”.
Charlote já nasceu com a deficiência e foi abandonada ainda filhote em uma feira de adoção de animais da ONG Natureza em Forma, na Avenida Paulista, nos Jardins. Alves costuma trabalhar como voluntário no local e sabia que seria difícil encontrar alguém disposto a adotá-la. “As pessoas deviam olhar mais para esses animais porque eles também merecem uma chance”, acredita o jovem.
Gato preto e cego Além do medo de encarar a responsabilidade de cuidar de um bicho deficiente, há ainda o sentimento de pena. Esse sentimento foi o primeiro que passou pela cabeça de Angélica Perez, de 27 anos, quando ofereceram para ela um gato que, além de preto, estava ficando cego.
“De cara, eu me assustei porque achava que não ia conseguir cuidar dele, que ia ter muita dó”, conta. Mas o gatinho precisava de um dono com urgência, pois ia passar por uma cirurgia justamente para retirar os olhos doentes e não tinha ninguém para cuidar dele. Angélica, então, topou o desafio e levou Teddy Murfy para casa logo que ele recebeu alta do hospital veterinário.
“Ele ainda estava com os pontos e a carinha toda raspada, sem pêlo. Sempre que ia pegar ele no colo para limpar, ele ficava nervoso, e eu percebi que era trauma de tanto levar injeção quando estava doente”, relembra.
Meses depois da adoção, que está perto de completar um ano, Teddy se recuperou e virou xodó da família. “Ele corre no quintal, brinca com os meus dois cachorros e já apareceu em casa com inseto e passarinho na boca”, diz a dona.
Angélica diz que seu mascote é um gato “como qualquer outro”. “Ele pega mosquito voando, levanta a cabeça quando a gente fala com ele. Com Teddy eu aprendi que não adianta ficar com dó. A gente tem de dar uma chance para eles viverem felizes”.
http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,MUL725347-5605,00.html
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